SAMBA SE DESPEDE DE BIRA PRESIDENTE
Bira Presidente

O samba amanheceu mais triste. Morreu na noite de sábado (14), no Rio de Janeiro, aos 88 anos, Bira Presidente, fundador do Cacique de Ramos e do lendário grupo Fundo de Quintal. Ele estava internado no Hospital da Unimed Ferj, na Barra da Tijuca, em tratamento contra um câncer de próstata e sofria de Alzheimer.
Figura fundamental para a história do samba, Bira foi responsável por transformar as tradicionais rodas do subúrbio carioca em um movimento cultural que mudou para sempre a cara do samba no Brasil. “Ele era mais do que presidente. Era o próprio Cacique em pessoa”, dizem os amigos e companheiros de música.
Ubirajara Félix do Nascimento, nascido em 23 de março de 1937, no Rio, cresceu no bairro de Ramos, na Zona Norte, em uma família mergulhada na cultura popular e na música. Filho de Domingos Félix do Nascimento e Conceição de Souza Nascimento, foi criado entre rodas de samba, encontros de choro e festas regadas à religiosidade da Umbanda, praticada por sua mãe.
Desde criança, teve contato com lendas da música brasileira como Pixinguinha, João da Baiana e Donga, que costumavam frequentar a casa da família. Aos sete anos, desfilou pela primeira vez na Estação Primeira de Mangueira, escola que levava no peito até os últimos dias.
Cacique de Ramos: muito mais que um bloco
No dia 20 de janeiro de 1961, Bira fundou, ao lado de amigos e parentes, o Grêmio Recreativo Cacique de Ramos, inicialmente como um bloco carnavalesco do bairro. Mas não demorou para que se transformasse em um dos maiores polos culturais do samba no Brasil.
A sede, apelidada carinhosamente de “Doce Refúgio”, virou ponto de encontro de músicos e compositores que mais tarde escreveriam alguns dos capítulos mais importantes da música popular brasileira. Era lá que o samba corria solto em rodas que reuniam talentos do subúrbio carioca e da cidade inteira.
Bira era mais do que presidente: foi o primeiro e único líder da história do Cacique, carregando o título até seu último dia.
Fundo de Quintal: a revolução do samba
Foi das rodas do Cacique de Ramos, no fim dos anos 1970, que nasceu o grupo Fundo de Quintal, revolucionando o samba ao incorporar instrumentos que até então não eram comuns nas rodas, como o tantã, o repique de mão e o banjo.
A sonoridade criada por Bira e seus companheiros virou referência e mudou os rumos do samba de raiz, abrindo caminho para toda uma nova geração de grupos que seguiram seus passos.
No pandeiro, Bira era inconfundível — presença marcante nos palcos, nas gravações e nas rodas, sempre sorridente, com aquele jeito irreverente que virou sua marca registrada. Participou de gravações históricas, como no álbum “De Pé No Chão”, de Beth Carvalho, que foi uma das principais madrinhas do grupo.
Entre os sucessos eternizados na sua voz e no seu pandeiro estão “O Show Tem Que Continuar”, “A Amizade”, “Lucidez”, “Do Fundo do Nosso Quintal” e “Nosso Grito”.
Um legado além da música
Além da vida dedicada ao samba, Bira também trabalhou por décadas como servidor público, antes de se dedicar exclusivamente à carreira artística.
Era apaixonado pela dança de salão, torcedor roxo do Flamengo e uma das figuras mais queridas da música brasileira. Com seu carisma e seu sorriso sempre aberto, era presença obrigatória em qualquer roda de samba — do subúrbio às grandes casas de espetáculo.
Bira deixa as filhas Karla Marcelly e Christian Kelly, os netos Yan e Brian, e a bisneta Lua.
Nota oficial
Em nota conjunta, o Cacique de Ramos e o Fundo de Quintal lamentaram profundamente a perda: “Hoje nos despedimos daquele que é o próprio Cacique. Bira construiu uma trajetória marcada pela firmeza, pela ética e pela contribuição inestimável ao samba e à cultura popular brasileira. Sua atuação no Cacique de Ramos moldou o bloco e o samba. No Fundo de Quintal, foi o ponto de partida de uma linguagem que redefiniu a roda de samba e inspirou gerações”.
Comentários (0)